8 de julho de 2007

Tarde de Domingo



A mesa da sala tinha uma linda toalha branca rendada e por cima dela haviam dois vasos azuis, um com rosas vermelhas, sua flor e cor favoritas, e o outro com rosas brancas, apenas para dar um toque suave à ocasião.


Na mesa havia também muitos e diversos doces, alguns tipos de bombons e refrigerantes e alguns sucos. Quem olhava a mesa posta daquela maneira poderia até pensar que era mais uma reunião de família, mais um dia de festa, mas era uma despedida.


Ela olhou aquela mesa tão bonita, pegou apenas um cafezinho e se sentou na poltrona q havia na entrada da sala para aguardar as pessoas que começavam a chegar aos poucos.


Todos a cumprimentavam, a beijavam e a abraçavam. Ela se perguntava se em algum momento da vida havia visto todos juntos daquela maneira. Seus filhos, netos, sobrinhos, primos... enfim, todos a quem ela podia podia chamar de família, mesmo distante. E aquilo de alguma forma a confortava, ela se sentia amada, bem quista e acima de tudo, bem cuidada.


Se levantou e passou mais uma vez pela mesa, agora já com doces desfalcados e a toalha um pouco remexida. Deslizou os dedos por sobre ela e começou a se lembrar de tantos almoços e jantares que fez ali. Tantas reuniões de família, que às vezes a mesa ficava pequena para tanta gente.


Foi para perto da janela da sala, onde o piano ficava, se sentou no banco e dedilhou alguma música sem muito sentido. Fechou as teclas e se perdeu em alguns instantes nas fotografias algumas em preto e branco até que uma de suas netas a chamou e disse que estava na hora.


Ela segurou aquela pequena e delicada mãozinha e a seguiu até o jardim onde todos a estavam aguardando. Ela estava linda, e havia demorado muito para se arrumar, passou a noite anterior escolhendo qual seria o melhor vestido para aquela ocasião; escolheu um vestido que fosse sério mas que não transmitia tristeza. E até ao cabeleireiro foi para ficar mais bonita.


Quando chegou à porta que saía para o jardim, sua neta soltou de sua mão e correu para a mãe. Todos a observavam, imóveis, calados. Ela desceu os três degraus para chegar até o jardim e não caminhou muito até que chegasse ao caixão. Ela pensava apenas em como ele parecia estar bem, como estava bonito, embora ela estivesse triste por ter que se despedir para sempre, por ter que dormir e saber que não o veria na manhã seguinte.


Passou a mão nos cabelos brancos e volumosos, acarinhou seu rosto, e, então, a primeira lágrima caiu; sua filha quis se levantar para a abraçar e confortar, mas sua filha que havia levado a avó até lá segurou tão forte sua mão que ela desistiu.


Suas mãos já não mais delicadas e macias, por causa da idade avançada, segurava as mãos de seu amado como já havia feito tantas vezes antes; enquanto a outra mão segurava a aliança que era dele e que agora estava na gargantilha em seu pescoço. Se lembrou de todos os momentos importantes que passou ao lado de seu amado: quando se conheceram, o namoro, o pedido de casamento... os filhos, as brigas e reconciliações...


Não sentia raiva por ele ter quebrado a promessa de ir embora por último, afinal já havia quebrado tantas outras promessas antes...


Enxugou mais uma lágrima, respirou fundo, virou as costas e caminhou cabisbaixa até a primeira cadeira. Ficou lá, sentada, pensativa por alguns minutos, se levantou e disse que já podiam levá-lo pois já havia se despedido.


Os filhos fecharam o caixão e seguiram com o cortejo, mas ela não quis ir e deu como desculpa a necessidade de limpar a casa pois "as crianças haviam feito muita bagunça". Mas não foi isso que fez. Foi até a mesa, que agora estava praticamente sem doces e sem toalha, pegou alguns doces, uma xícara de café e caminhou devagar até o piano, onde se sentou e pela janela apreciou o pôr-do-sol na companhia de seu amado nas fotografias, em sua mente e para sempre em seu coração.

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